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Marcelo Testoni
Colaboração para VivaBem
01/07/2021 04h00
Mente sã, corpo são. Já ouviu esse ditado? Pois faz muito sentido. Para o corpo funcionar bem, o psicológico e o emocional precisam estar saudáveis —e vale o contrário.
Estado físico e mental não andam separados. Tanto que ansiedade, estresse e depressão podem cursar com alterações de sono e apetite, perda de energia, enquanto quadros psicóticos, a exemplo de esquizofrenia, com dores de cabeça, nas costas, musculares, fraqueza e problemas digestivos.
"O componente psíquico está sempre presente em todos os casos", garante Wimer Bottura, psiquiatra e presidente da ABMP (Associação Brasileira de Medicina Psicossomática).
De acordo com ele, hormônios, como adrenalina e cortisol, liberados por medo, tristeza e raiva constantes geram um desequilíbrio bioquímico e, inicialmente, uma alteração funcional, mesmo sem presença de dano físico, e a persistência disso causa uma alteração estrutural, ou seja, o estabelecimento de uma doença pela forma como o paciente se relaciona com o seu redor.
"O cérebro não trabalha com fatos, mas com informações sobre fatos e numa tentativa de se defender de uma ameaça não identificada pode reagir com manifestações relacionadas ao emocional. A maioria das pessoas que procuram atendimento de urgência não tem doenças, mas alterações funcionais que vão evoluir para algo se não tratadas", complementa Bottura.
Da cabeça para o corpo
Doenças psicossomáticas portanto são aquelas
provocadas ou agravadas por sofrimento psíquico, geralmente involuntário e
inconsciente, acompanhado de alterações de certas funções orgânicas e
corporais.
Negativismo, traumas, pressão ou violência
psicológica, esgotamento profissional, bullying, autocobrança, tudo isso têm um
impacto sobre a saúde ou doenças, como gastrite, diabetes mellitus, hipertensão, fibromialgia, artrite reumatoide, asma.
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Mesmo saudável fisicamente, a pessoa pode ter inflamação, alergia, dores, crise de falta de ar, taquicardia e diarreia.
Por isso, até descobrir o que se tem de
verdade, quem apresenta doenças psicossomáticas, ou transtorno de somatização,
está suscetível a sofrer por bastante tempo e, em busca de um diagnóstico que
às vezes considera ser apenas físico, pode se viciar em realizar vários exames
idênticos e se consultar com diferentes médicos, sem ter sucesso.
"Fazer isso não só não é indicado como é
prejudicial, pois procedimentos invasivos e desnecessários oferecem riscos. Se o
paciente vai a uma urgência é preciso informar se a condição que ele apresenta
possui um histórico, é monitorada por um médico e se ele toma
medicamentos", informa Natan Chehter, geriatra pela SBGG (Sociedade
Brasileira de Geriatria e Gerontologia).
Efeitos psicossomáticos
Alexandre Walter Campos, neurocirurgião pelo
Hospital Heliópolis (SP) e da Central Nacional Unimed, explica que quase nada
acontece no organismo sem que haja a participação do cérebro.
"A interação cérebro-intestino, por exemplo, se dá desde o nível do sistema
nervoso periférico, nos órgãos abdominais, até o sistema nervoso central em
relação com o sistema límbico, 'circuito das emoções', e sistema
neuroendócrino, que regula a atividade hormonal".
Portanto, qualquer um está sujeito a
apresentar dos pés à cabeça, os vários efeitos a seguir:
· Boca e garganta: secura; sensação de bloqueio; irritações, inclusive das amígdalas
· Coração e circulação: palpitações; dores; tremores; suor frio; elevação da pressão arterial
· Estômago: dor e queimação; sensação de náusea; piora de gastrites; falta de apetite
· Intestino: diarreia; prisão de ventre; síndrome do intestino irritável
· Músculos e articulações: dores; tensões; contrações; deformidades posturais; fadiga
· Pele: coceira; ardência; manchas vermelhas ou arroxeadas pelo corpo; escamação
· Pulmões: respiração rápida e ofegante; sufocamento; alergia e inflamação das vias áreas
· Rins e bexiga: dor ou dificuldade para urinar; retenção urinária
·
Sistema nervoso: enxaqueca;
alterações visuais, de equilíbrio, sensibilidade e movimento; formigamentos; dificuldade
para relaxar, dormir, se concentrar; irritabilidade; desânimo
· Sistema reprodutor: impotência sexual; redução da libido; alterações do ciclo menstrual
O que faz um paciente ter mais sintomas físicos ou mais sintomas mentais ainda não é muito claro. A causa provavelmente é multifatorial.
Também há casos em que há
"conversão" ou "integração" de sofrimentos somados a
pensamentos obsessivos que culminam em sintomas extremos, de cegueira,
paralisia e a impressão de que se vai infartar, convulsionar ou ter um AVC.
É preciso considerar tudo
Diante de sintomas físicos, um especialista
deve investigar os fatores diretos que poderiam originá-los. Caso o que sinta seja
disseminado ou vago, uma consulta com um clínico geral e a realização de exames
básicos pode ajudar na triagem diagnóstica.
Após a exclusão de todas as possíveis causas
orgânicas, o paciente então pode ser avaliado por um psiquiatra. Assim, o diagnóstico
psicossomático é clínico e só ocorre após tudo que é possível ter sido
realizado.
Mas espera-se que antes, na consulta, o médico
leve em consideração todas as dimensões do paciente e procure saber sobre suas
relações sociais e seu estado psicológico, para ter uma concepção plena do
adoecimento.
Nesse contexto, caso nada de estranho seja
diagnosticado, mandar o paciente para casa com algum medicamento para sintomas
não resolverá a causa. Seus relatos e sintomas devem ser respeitados e
considerados pelo profissional de saúde.
São sinais para que se tenha mais atenção ao
organismo, qualidade de vida, bem-estar social e psicológico.
São sinais para que se tenha mais atenção ao organismo, qualidade de vida, bem-estar social e psicológico.
Por isso, de acordo com Anderson Weiber, psiquiatra do Hospital Geral Prado Valadares, em Jequié (BA), e professor na Afya Educacional, em Salvador, é necessário explicar o que pode ser e convencê-lo da necessidade de se fazer uma investigação psicológica.
"O psiquiatra é importante como interconsultor destes casos. Isto é compreensível pelo médico clínico geral poder lidar melhor com as queixas 'físicas' do paciente e trazer mais conforto e segurança na condução do caso. Quando presentes ansiedade e depressão, o tratamento é feito com uso de medicamentos e psicoterapia. Na ausência de comorbidades psiquiátricas, apenas psicoterapia e mudança de estilo de vida são indicadas", finaliza Weiber.